A descoberta de uma série de antigos locais de enterro em Matozinhos, na região metropolitana de Belo Horizonte, no estado de Minas Gerais, ajudou a lançar luz sobre rituais funerários verdadeiramente macabros que ocorreram em torno de 9.500 anos atrás.
Os corpos mutilados, alguns com sinais de canibalismo, representam a mais antiga evidência de tradições funerárias complexas nessa região da América do Sul.
Os autores do estudo revelam que os ossos – datados de 9.400 a 9.600 anos atrás – foram encontrados em uma caverna chamada Lapa do Santo e exibem sinais de “manipulação”.
- Rituais macabros
Em entrevista ao portal Discovery News, um dos pesquisadores do estudo, André Strauss, explicou que “os enterros incluíam ossos com marcas de corte, exposição ao fogo, uma cabeça enterrada com mãos amputadas e crânios em que todos os dentes foram intencionalmente removidos”.
Ou seja, os rituais funerários eram complexos. Primeiro havia uma redução dos corpos – pela mutilação, retirada da carne, remoção de dentes, exposição ao fogo e possivelmente canibalismo – e depois um enterro secundário dos restos, de acordo com regras estritas.
- Sete padrões
Entre 2001 e 2009, foram exumados 26 sepultamentos em Lapa do Santo, distribuídos em sete padrões distintos: enterros simples e articulados; manipulação perimortem e o subsequente enterro dos ossos desarticulados de múltiplos indivíduos; esqueletos desarticulados de um único indivíduo, cujos ossos longos comumente apresentam fraturas perimortem, depositados em covas circulares; esqueletos cujos membros foram removidos; enterro de esqueleto completo desarticulado na forma de feixe; cremação; e enterro em cova circular, recoberto por blocos de arenito.
Em uma das sepulturas, os ossos pareciam dispostos de acordo com as crenças cosmológicas centradas em um princípio dicotômico, expresso por pares de oposições entre categorias abstratas. “Essa lógica é inferida pela presença da dupla dicotomia entre ‘adulto’ e ‘subadulto’ e entre ‘crânio’ e ‘pós-crânio’, entre ‘diáfise’ e ‘extremidade do osso longo’ e entre ‘dente’ e ‘alvéolo vazio’”, escreve Strauss em um artigo.
Uma sepultura próxima continha restos de corpos que aparentemente tinham sido decompostos em outros lugares e levados à Lapa do Santo para serem enterrados.
Curiosamente, esses rituais bizarros parecem ter acabado após um tempo, já que os corpos enterrados entre 8.200 e 8.600 anos atrás não mostram nenhuma evidência de mutilação ou manipulação. Isso demonstra que a região foi habitada por grupos dinâmicos em constante transformação ao longo de um período de séculos.
Para ler o artigo de André Strauss (em português), clique aqui.